Guy Acolatse - O primeiro jogador profissional negro da Alemanha

*Texto traduzido*

Com um país pouco acostumado a multiculturalismos e se reerguendo após a II Guerra, a chegada de Guy Acolatse trouxe uma nova cara ao futebol alemão. E claro que ele jogou no FC St. Pauli.



Guy Acolatse fez o seu caminho para o Millerntor em um táxi sem saber o que o aguardava em 14 de julho de 1963. O meia togolês fez a sua estréia na seleção aos 17 anos, quatro anos depois ele recebeu ofertas da França, Bélgica e do FC St. Pauli. Mal sabia ele o que estava por vir quando ele optou pelo lado alemão. Assim que aterrissou ele viu uma multidão que o aguardava. "Deve haver algum jogo hoje", pensou ele, antes que o novo treinador do FC St. Pauli, Otto Westphal dissesse  a ele que todos estavam a sua espera. O novo homem no comando dos Piratas havia sido técnico do Phönix Lübeck e da seleção de Togo antes de entrar no St. Pauli, e o próprio Westphal queria trazer Acolatse com ele para Hamburgo de acordo com o meia, ele disse:

"O FC St. Pauli está em busca de um camisa 10 e Otto Westphal perguntou se eu estava interessado em ir para a Alemanha. Eu disse que sim".

As manchetes

A chegada do primeiro jogador negro em Hamburgo foi o assunto do momento, e a mídia foi ao delírio para cobrir a chegada da estrela africana. O jornal alemão Zeit descreveu a contratação do primeiro jogador profissional negro como "golpe publicitário, que deixou os maiores times da Bundesliga cheios de ciúmes".

O tablóide Bild descreveu os atributos do jogador como "Negro como a noite, rápido como um antílope e um chute como um rifle desenvolvido para matar elefantes" (N.T: de mau gosto, como só o Bild sabe ser).

"Os alemães me viam como uma atração, eles nunca haviam visto um homem negro em toda a sua vida". Algumas pessoas chegaram ao extremo de pensar que poderiam arranhar sua pele passando as unhas, de acordo com o jogador.

Impacto no St. Pauli

Os piratas estavam voltando a jogar na Regionalliga Nord e o técnico Otto Westphal tinha altas expectativas dizendo ao Bild que ele poderia "se transformar em um grande jogador". O jogador togolês honrou a confiança de seu treinador marcando um gol em seu primeiro amistoso. Seu desempenho contra o Altona 93, no primeiro jogo da temporada de 1963/64, foi recebido com grande entusiasmo pela torcida e a mídia cantou louvores ao jogador. O Hamburger Abendblatt escreveu sobre sua "primorosa técnica, toque sublime e seu altruísmo em frente ao gol", enquanto o Bild encontrou uma maneira simples de dizer isso, escrevendo:

"Negro togolês leva 7.000 espectadores ao delírio".

Time da Temporada 1963/64

Acolatse encontrou o seu próprio caminho na segunda divisão, na maior parte do tempo usando sua técnica esplêndida. De vez em quando ele cavava algumas faltas, admite atualmente. Quando descobria que seu oponente tinha medo dele, tirava proveito disso:

"Quando eu jogava, eu dizia ao meu oponente: 'Ei, se você me tocar eu vou te morder! O negão morde! ' Eles eram mais velhos que eu, mas tinham medo de mim".

O St. Pauli chegou ao topo da Regionalliga Nord depois de 34 jogos e o jogador foi destaque em 24, provando ser uma posse valiosa para o time. Principalmente na assistência aos artilheiros e estrelas do time, Peter Osterhoff e Horst Haecks. O jogador mesmo marcou apenas dois gols durante sua primeira temporada no clube.

Se você perguntar a Acolatse, um dos seus grandes momentos, este aconteceu durante os play offs na temporada de 1963/64. Quando um jogador em especial fez a sua estréia pelo Bayern München contra o St. Pauli e marcou um gol pelos Bávaros que venceram por 4-0 no Volkerparkstadion. Ele se lembra do jogo como se fosse hoje:

"Eu joguei contra Franz Beckenbauer. Ele fez sua primeira aparição. Eu simplesmente não consigo esquecer"!


O jovem Franz Beckenbauer


St. Pauli perdeu por 6-1 no returno, com Acolatse marcando o único gol para o St. Pauli.

Otto Westphal deixou o St. Pauli após o fim da temporada e o time não conseguiu repetir o sucesso da temporada de 1963/64. Acolatse ainda era integrante do time, jogando 18 partidas e marcando 5 gols durante sua segunda temporada no time. Kurt Krause, novo técnico, surpreendeu o St. Pauli após uma tumultuada temporada, em 1964/65, e disse a Guy Acolatse que seus serviços não eram mais necessários. O jogador participou de mais um jogo pelos piratas e deixou o clube para entrar no Barmbk-Uhlenhorst, rival local do St. Pauli. Depois de 3 anos ele retornou ao time para jogar pelo St. Pauli II, por três anos, e de vez em quando pelo principal, quando necessário. Em 1973 Acolatse começou a treinar jovens jogadores em Hamburgo antes de deixar a cidade definitivamente em 1980 e mudar para Paris (onde ele vive até hoje).

Contudo, quando ele analisa os anos que passou na Alemanha ele estampa um sorriso no rosto. Nos anos 60 ele foi um dos primeiros negros a chegar no país e tem ótimas lembranças de quando ele saia em Hamburgo:

"Naquela época eu era a única pessoa negra na Alemanha e o único jogador togolês . As pessoas me olhavam quando eu estava andando em Hamburgo, sendo um homem negro. Mas eu não me importava".

Jogar pelo segundo maior clube da cidade foi lucrativo, mesmo naquela época, de acordo com o meia:

"Hoje os jogadores recebem uma bolada, o que não era o caso naquele tempo. Mas eu tinha uma vida boa. Um trabalhador na Alemanha recebia 400 DM (Deutsche Mark, ou Marco Alemão. Moeda corrente antes da entrada do Euro) naquela época. Eu fazia 5 vezes mais que isso, com os bônus de jogos e outras coisas. Era muito dinheiro. Eu tinha um apartamento e um carro pequeno, de início um FIAT e depois o carro dos meus sonhos que era um VW 1600".

O meia diz que sua temporada na Alemanha foi ótima, enfatizando o quão bem tratado ele foi pelo St. Pauli. Mas os fãs naquela época não eram tão mente aberta como são hoje. O jogador acha que a frustração quando o time estava jogando mal atingia alguns espectadores:

"Se você estava jogando mal, os espectadores começavam a resmungar, eles queriam que você jogasse bem no fim das contas. As pessoas gritavam: Guy, se você não marcar você irá ganhar uma banana. Seu macaquinho. Mas, mesmo se você marcasse um ou dois gols e mesmo assim o time acabasse perdendo, os espectadores ainda ficavam bravos. Hoje os grandes jogadores não sabem lidar com isso, eles se sentem insultados e eles choram por causa do racismo. Eu não posso dizer coisas ruins sobre os alemães daquela época. Eu tive uma ótima vida aqui"!

Guy Acolatse retornou a Hamburgo para celebrar os 100 anos do FC St. Pauli em 2010. 


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